Por mais de um ano trabalhei no PEA (Programa Escola Aberta) na Secretaria de Educação do Estado (PE).
O PEA ficava no Edifício Pernambuco, ali na Dantas Barreto de esquina com a Guararapes.
O escritório era todo fechado, apenas a cozinha tinha uma janela.
Uma janela pequena enfeitada por dois jarrinhos com plantas.
Era pra cozinha que eu ia quando já havia perdido a noção da hora.
E era lá que eu observava o tempo.
Passava o dia numa sala em meio a papéis, números, telefonemas e algumas pessoas reclamando, sem saber que lá fora estava caindo uma chuva que batia na janela e molhava as plantinhas.
Ah, as plantinhas!
Essas estavam no lugar certo.
Na beira da janela.
Ali elas levavam sol e eram aguadas em dias de chuva.
Como eu queria estar no lugar delas. Olhar a praça. Ver gente.
E era pra lá que eu ia.
Era lá que eu esquecia os números, os cálculos, as notas... E olhava.
Simplesmente, olhava.
No banco daquela pracinha tinha uma estátua de um homem sentado, segurando um jornal.
Nunca desci lá para ver, mas acredito que seja de alguma personalidade importante para o Estado, um escritor...
Percebi que todos que ali sentavam, costumavam olhar o jornal de concreto.
- Curiosidade.
Mas havia um homem que fazia mais do que olhar.
Ele também conversava com a estátua.
Percebia em sua face a expressão de quem indagava e ainda se aproximava do rosto da estátua.
Olhos nos olhos.
Esse homem me surpreendia, sempre o via por ali e me questionava:
- Parece louco
Um homem com roupas sujas, descalço conversando com uma estátua.
Como pode?
Não havia diálogo, o outro jamais responderia.
Seria a solidão que fazia o homem chegar a esse ponto?
Depois de um tempo vendo essa cena diariamente, percebi que ali havia cumplicidade.
O homem não preciva de respostas, apenas de companhia.
Louco?
Não era ele quem vivia numa sala fechada, cheia de papéis e números.
Descalço, o homem era livre!
Com aquele homem, aprendi que a solidão pode fazer a pessoa sentar-se num banco e conversar com uma estátua.
E pode fazer também alguém sentir-se preso, olhando a vida por uma pequena janela.
Gabriele Lima 01/10/10
